quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Liberdade de expressão, ainda que tardia

Entre os absurdos propostos pelo 3º Programa de Direitos Humanos, apresentado dias atrás pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, destaco aquele que propõe o “monitoramento da linha editorial dos meios de comunicação” para evitar abusos dos direitos humanos. Ora, isso nada mais é do que CENSURA travestida de pseudoproteção aos direitos humanos.
Se você, inimigo leitor, acompanha as notícias, já viu que os representantes de vários tipos de mídias (impressa, audiovisual, on-line) e de associações (Abert, Aner etc.) se manifestaram contrários ao programa de Direitos Humanos, baseando-se no argumento de flagrante desrespeito à liberdade de imprensa. Mas, não pense que essa “censura branda” se restringe apenas ao universo corporativista da imprensa. Não, nos afeta diretamente. Trata-se da violação da liberdade de expressão, bem imaterial, garantido constitucionalmente.
Quando um jornal impresso ou site de notícias passa a sofrer controle de informação, cria-se uma situação permissiva, em que os interesses de outro, no caso do governo Lula (aliás, um presidente que tem verdadeiro tesão por controlar os meios de comunicação), se sobrepõem aos nossos (eu e você, inimigo leitor). É como se, mal comparando, você fosse a um bar tomar uma Skol e, no momento em que a cerveja estivesse na mesa, aparecesse um funcionário do governo e a retirasse de suas mãos, alegando que você só pode tomar Kaiser. Que horror!
Se essa diretriz de restrição da liberdade de expressão for aprovada pelo Congresso brasileiro, vira lei. Aí, o negócio vai complicar, pois será uma volta da censura oficial e da perseguição de ideias.
O que me admira em toda essa história são as pessoas que elaboraram o tal programa de Direitos Humanos, principalmente o titular da pasta, Paulo Vannuchi. Elas fizeram parte da esquerda brasileira perseguida pela ditadura militar, nos anos 60-70 do séc. 20. Naquela época, havia o AI-5, que instituía a privação de todas as liberdades, dando plenos poderes ao governo militar. Por isso, surgiram grupos armados de esquerda, que lutavam pelo fim da censura e da perseguição política.
Assim, a volta da censura, que tantos males trouxe ao Brasil, é no mínimo contraditória.
Porém, pensando bem, talvez não seja tão incoerente assim. Historicamente, a esquerda brasileira, tanto no plano intelectual quanto no plano da luta armada, defendia o discurso de instauração da “ditadura do proletariado”. Traduzindo: queda dos militares para colocar em seu lugar um governo de esquerda, preocupado com as massas (e as maçãs); mas também marcado pela adoção de um regime autoritário, forçando os brasileiros a serem mais coletivos com seus bens e lucros. O Brasil seria uma extensão da antiga URSS, com seus horríveis carros Ladas e cossacos.
Portanto, nos anos 60-70, sob o manto obscuro da igualdade e coletividade, a esquerda brasileira, pretensamente marxista e trotskista, queria fazer a mesma coisa que os militares. Ou seja, seis por meia dúzia.
Hoje, em pleno séc. 21, o governo Lula, comandado por alguém que nem ao menos leu Karl Marx, pretende, sob outro manto obscuro (dos Direitos Humanos), o mesmo em relação à liberdade de expressão. Como é triste a história intelectual brasileira, principalmente à esquerda.