sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Uma amizade entre livros

(Foto: guardachuvadelaura.blogspot.com)
Com a ajuda de Verissimo (dir.), Bertaso construiu a Editora Globo, em Porto Alegre


Mistura de crônica, relato autobiográfico e novela, o livro Um certo Henrique Bertaso (Ed. Companhia das Letras) relata a amizade entre o escritor Erico Verissimo e o editor Henrique Bertaso. Juntos, os dois ajudaram a formar uma das editoras mais conhecidas do Brasil em meados do século 20: Globo (sem relação com as organizações Globo da família Marinho).

Narrada em primeira pessoa pelo próprio Verissimo, pai de Luiz Fernando Verissimo, a obra foi lançada originalmente em 1972 e pertencia a uma fase mais memorialista do escritor gaúcho. Nessa época, ele encerraria sua carreira literária com o romance Incidente em Antares (1971) e o autobiográfico Solo de Clarineta (1973/76). Em seguida, viria a morrer em 1975.

Graças a extensão e popularidade de suas obras literárias, muita gente conhece apenas o lado escritor de Verissimo. Mas, antes desse sucesso, ele trabalhou como tradutor, revisor, editor e consultor literário da Globo, uma livraria que viria a se tornar importante editora na primeira metade do século 20. E isso na ainda provinciana cidade de Porto Alegre.

Relançado em 2011, em nova edição, Um certo Henrique Bertaso narra um pouco da história de surgimento dessa editora. Segundo Verissimo, o principal responsável pelo sucesso da Globo foi o cara que dá nome ao livro: Henrique Bertaso. Filho de um dos donos da Livraria do Globo, Bertaso somente entrou para o ramo livreiro por acaso. Preocupado com seu tempo livre, o pai dele o encaixou como vendedor da loja. Tinha então início um dos editores mais importantes do Brasil, que conseguiu, junto com Verissimo, traduzir clássicos da literatura e lançar novos autores (um deles foi o poeta Mário Quintana).

O prestígio da editora foi tão forte que Roberto Marinho não pôde usar o nome “Globo” para registrar sua própria casa editorial no Rio de Janeiro. A saída para Marinho foi usar a marca RGE (Rio Gráfica Editora) para lançar livros, revistas e gibis. Somente décadas depois, com a falência dos Bertaso, Marinho enfim registrou o tão sonhado nome.

Hoje, quando nos deparamos com revistas da “Editora Globo”, uma coisa é certa: não é mais a mesma que fez história com Henrique Bertaso e Erico Verissimo.

SERVIÇO:
Livro: Um certo Henrique Bertaso (2011), 106 páginas
Autor: Erico Verissimo
Preço: R$ 35,00
Onde adquirir: Livraria do Chain, sob encomenda. Tel. 3035-6806


TRECHO SELECIONADO DA OBRA:
Mil novecentos e vinte e dois foi, sob muitos aspectos, um ano portentoso. François Mauriac publicou Le Baiser au lépreux. James Joyce sacudiu o universo literário com o seu Ulysses. John Galsworthy deu à Inglaterra e ao mundo The Forsythe Saga. Sinclair Lewis produziu Babbitt, e Pirandello, Henrique IV.
(…)
Tudo isso e muito mais aconteceu durante o ano de 1922, porém um pequeno fato que a História com H maiúsculo não registrou, um incidente sem significação para o grande mundo mas de importância capital para a estória que vou contar nesta crônica, ocorreu na cidade de Porto Alegre. O menino Henrique d'Ávila Bertaso perdeu as suas férias de verão porque o pai, um dos sócios principais da Livraria do Globo, achou que o mais velho dos filhos varões, então com quinze anos, estava se transformando numa pequena peste doméstica, com tempo demais a pesar-lhe nas mãos e no crânio. Assim, à maneira dos velhos negociantes da tradição portuguesa (embora ele próprio fosse italiano, natural de Verona), resolveu fazer o rapaz trabalhar como “caixeiro” da sua livraria.
(p. 14)

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